Estamos em obra: sobre machismo, diagnóstico e tratamento.
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Foto antiga que seria usada para apresentar o EP "Estamos Em Obra" |
Oi, meu nome é José Nunes e..., eu sou machista!
Introdução
Hoje, analisando algumas situações que vivi, me pergunto, quantas vezes fui machista e nem percebi? A minha resposta é: todas até eu entender que era machista. Há 3 coisas que algumas pessoas ainda não entenderam:
- Não dá pra deixar de ser machista sem antes admitir que é um. Essa regra se aplica também aos racistas e preconceituosos de todos os tipos.
- Quanto mais imerso no universo do oprimido e, compreendendo suas dores, mais distante ficamos do ponto de vista de quem oprime.
- Não existe uma vacina instantânea contra o machismo, é um processo em que, a cada dia que você aprende a escutar e usar da empatia, se torna mais alerta e passa a se autominitorar, então, paulatinamente vai recochecendo suas atitudes machistas no dia a dia e corrigindo sua conduta.
Vou dar 2 exemplos, em 2 estágio distintos, onde me vi machista, mas farei isso usando letras de músicas que escrevi.
O Cravo e a Rosa.
Anos atrás, por volta de 2009, compus uma música chamada O Cravo e a Rosa. Na época, pautas feministas não estavam evidentes como hoje, essa é uma percepção minha. Nesse período, se eu, ou algum outro artista tivesse gravado essa música, talvez passasse batido da crítica, a música seria vista como um reflexo social e talvez, até mesmo como "engraçada".
Na ocasião, cantei a letra para algumas pessoas que gostaram e eu sinceramente também havia gostado muito, pois já naquela época, embora houvesse pensado em compor para outros, eu não tinha grandes pretensões como um compositor profissional e nem sabia nada sobre o mercado da música para compositores, todavia gostei muito de ter começado a música pelo refrão, o que é algo muito assertivo nos tempos de hoje onde a música precisa chegar logo no refrão.
Essa música narrava uma situação na história de um casal e no refrão, logo de cara fazia uma analogia de forma metafórica em que, Rosa, a mulher, era como a rosa, a flor, muito bonita e perfumada, mas cujo os espinhos feriam, no entanto, a música fazia isso de forma muito grosseira e agressiva, verbalmente falando, vide o trecho a seguir:
"O Cravo brigou com a Rosa, pois a Rosa era uma vadia,Exalava um perfume gostoso, mas o seu espinho era o que feria"
Aqui o ponto de vista é de um relacionamento tradicional, onde se espera, muitas vezes de forma implícita, que as partes envolvidas possuam exclusividade na relação amorosa. Depois, no primeiro verso, usando uma cronologia reversa, inicio a explicar como foi que chegaram a essa briga:
"Foi um quebra pau desgraçado e os dois acabaram na delegacia,o Cravo saiu arranhado com a marca de um tapa que não merecia,Rosa com apenas um salto e outro pé descalço entrava em histeria,com marca de um tapa na cara, presente do qual Cravo se arrependia"
Quando escrevi isso, essa situação parecia ser "normal", em minha cabeça, de alguma forma, o final da música que revelava o motivo da briga, justificava essa atitude do Cravo na discussão com Rosa. Eu achava que tudo bem, pois eu narrava as coisa como elas de fato são, aquilo não era uma história real, embora muitas histórias assim e até piores, de fato aconteçam.
A atitude de Cravo era machista, mas no final da história eu revelo que ele foi traído, isso enquanto ele trabalhava para fazer algo legal para Rosa, mas houveram problemas no trabalho, a grana que ele achou que viria atrasou e ele voltou para casa mais cedo chateado por não poder realizar o que queria para surpreender Rosa e, ao chegar em casa, foi surpreendido, Rosa estava com outro.
Eu tentava justificar que a agressão do Cravo, um homem honesto, trabalhador e até romântico (ele pretendia comprar um vestido que Rosa queria como presente para ela), foi por conta de um dia negativamente atípico somado a atitude no mínimo desleal de Rosa, mas na narrativa eu não sou imparcial, praticamente apoio o Cravo que é vendido como um coitado e chamo Rosa de vadia.
Estamos em Obra
A outra é uma obra chamada "Estamos em Obra" que era a faixa que daria nome ao EP com 7 faixa que eu lançaria com uma de minhas parceira de composição, Gabi .B Mora.
Nela eu faço relatos pessoais costurando fatos com metáforas ligadas a obras de construção cívil, me desconstruindo enquanto conto quanto fui machista e até preconceituoso e fiz dessa forma para mostrar as pessoas que deixar de ser machista e preconceituoso é um processo.
Não se deixa de ser machista da noite pro dia, na letra digo:
"Ainda sou machista sim e sei que o rótulo pesa,
ajoelha e reza que esse pecado é seu Djose"
Ou seja, eu admito ser machista e sei que ninguém quer ser chamado assim, pois são terríveis as consequências que machistas impõe a sociedade e principalmente as mulheres.
Portanto, o peso desse rótulo também é terrível. No entanto, é como eu disse acima, é preciso a aceitar o rótulo e admitir o problema para que o mesmo possa ser tratado, do contrário não haverá mudanças profundas, apenas uma superficial esquiva, como fuga do rótulo machista pertubador.
Um outro agravante é que devido a gravidade das consequências do machismo, como o feminicídio, há uma urgência em que isso seja resolvido para que mais nenhuma pessoa seja vítima dessa infecção afim de que ela não se propague e mate mais mulheres.
Aqui você pode ouvir um rascunho da música Estamos Em Obra.
Conclusão
Dito isto, apesar do tratamento para deixar de ser machista ser um processo que leva tempo, assim como é para criamos qualquer outro novo hábito saudável, as mulheres não podem esperar, porque o machismo é como um câncer, quando mais cedo for diagnosticado, maiores a chances de salvar alguém.
Logo, assim como uma mulher que se autoexamina para tentar previnir um câncer de mama, você, meu caro leitor, deve fazer o mesmo com sua consciência e atitude, pois isso te torna uma pessoa melhor, mais saudável e o melhor, salva vidas.
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